domingo, 24 de outubro de 2010

Bom whisky

Sim, temos raiva das mulheres livres.
Sim, temos raiva de Marilyn e Paris.
Raiva da melancia, da melão, pêra, manga, uva, babaçu...da feira inteira.
Tachamos de vadia metade da população feminina e reprovamos especialmente aquelas cujo decote é indiscretamente fitado por nossos acompanhantes.
É cômodo para elas dizer que queremos ser iguais, e incômodo para nós admitirmos. Mas é verdade. Apesar de ninguém dar-se o trabalho de explicar o motivo.
Encarregar-me-ei das honras.
Felizmente, amoralidade – ou imoralidade – não é o forte de todas nós mulheres.
Não diria que é um dom, porque dom é algo além de inato, especialmente positivo. Ser amoral é tão positivo quanto rir em um velório.
Direi, então, que amoralidade é uma habilidade, e que muitas mulheres (e homens) descobrem que podem desenvolvê-la. Enquanto outras, não.
Outras não conseguem aderir à inconseqüência e à indiferença. Não conseguem se libertar das prisões morais, nem consideram a diversão e o prazer que teriam sendo ‘livres’ mais relevantes que seus princípios. Como disse, é simplesmente impossível para algumas de nós.
Nós de caráter e bom senso. Nós que pensamos pelo todo e desviamos o olhar quando somos encaradas por homens acompanhados. Nós que acreditamos que se todas agissem assim não existiria traição e que acreditamos que a infidelidade masculina deve recair tanto no homem quanto na falta de caráter da mulher cúmplice e da esposa complacente.
Serei reprovada por essa afirmação, mas ainda assim a digo:
Censuramos porque não conseguimos ser iguais - não porque não queremos ser iguais.
Afinal, quem não gostaria de saciar todas suas vontades? Quem não gostaria de não precisar resistir a impulsos? De se render a uma liberdade de realização superior à moralidade e à retidão?
Eu abro mão da hipocrisia e digo que nenhuma de nós renunciaria a essa possibilidade se ela nos fosse oferecida. Mas não é. E o que fazemos é revoltar-nos com todas aquelas que conseguem se libertar e ser menos mulher e mais objeto. Objeto não dos homens, mas da própria satisfação. Mulheres independentes de culpa e resignação e que se equiparam ao sexo oposto exatamente no aspecto mais sórdido.
Os sentimentos são, sim, amarras e mordaças. Mas eles também são fonte de força. E somos fortes porque é o que nos resta ser. Dedicamo-nos à carreira e outras diversões banais, porque os homens não são nossos parques de diversões.
Fingimos que somos amadas, porque queremos acreditar que há homens honestos como nós e que coincidentemente um deles foi parar ao nosso lado.
E bebemos, não porque pretendemos fingir que estamos bêbadas nem porque queremos ganhar imunidade - e atenção - suficiente para agir de forma reprovável. Mas porque não é nosso único passatempo encarar os rapazes presentes.
Temos MOTIVOS para comemorar.
Então, viva à inteligência, ao mérito, à honestidade e, principalmente, viva aos palavrões! Afinal, vamos chorar e nos separar quando descobrirmos que o maridão dormiu com aquelazinha do nosso escritório, mas pelo menos poderemos demiti-la e xingá-la - bastante - no dia seguinte.

sábado, 23 de outubro de 2010

Telefone

As mulheres sofrem porque no fundo todas acreditam que são especiais.
Feias, bonitas. Magras, gordas. Altas, baixas.
Todas acreditam haver algo mágico seja no olhar, no jeito, no carinho ou na fala.
Isso faz com que todas - sem exceções - se perguntem repetidamente porque ele não ligou.
E a mente cansa. E os dedos incomodam. E tudo o que conseguimos fazer é nos render aos dígitos do telefone.
E discar os números.
E enviar mensagens.

Senhoras, senhoras...
Eis que isto não é o problema.
Ou é o menor dos problemas.
Problema é perder a conta de quantas mensagens enviou. E de quantas vezes ligou.
E desesperar-se.
E Perguntar-se - e perguntá-lo - sobre o recebimento da anterior, e da anterior e da anterior...
Talvez isto nunca ocorreu realmente a você, como nunca ocorreu a mim.
Mas nenhuma de nós, no entanto, pode se vangloriar.
Pois a força faltou, mas a vontade existiu.
E a única diferença entre a ausente e a patética é que a ausente se sente um pouco pior.
E se ela escreve algo inútil é para ocupar as mãos, fugir do telefone e afastar, sorrateiramente, sua mulher de si.

Like love

Quando amo tenho doenças, tremores, enjôos.
Quando amo fico magra, feia, insone.
Quando amo viro flor,
pétalas frágeis e perecíveis,
espinhos expostos por medo de murchar de amor.

E morro todo dia por amor.
Porque sou tão fácil de amar,
que nem resisto mais.
Vivo um amor-paixão.
Que dói. Queima.

Paixão, quando forte, incinera corpo e alma.
E como toda boa mulher, gosto de ser cinzas às vezes.

Reciprocidade

Mulheres como eu não se ama.
Finge-se que não ama, para depois de conhecer amar de verdade.

Carta

Escrevo sem destinatário.
Porque a ninguém importa a dor.
Ninguém a consola ou a entende verdadeiramente além de mim.
Cada um tem sua dor. E duas dores não moram juntas.

A metodologia é simples:
Envio mensagens bonitas.
Arquivo as feias.
Simplesmente para não ser tão enfadonha quanto a vida.

Sou, sim, incurável problemática.
Mas designo aos meus problemas três estágios:
Penso.
Escrevo.
Supero.

quinta-feira, 16 de setembro de 2010

Happily ever after

O desejo do eterno.
Insisto em procura-lo.
Mas não o encontro nem nos livros, nem nos sonhos, nem nos poetas.
Porque ficção não simplifica mais.
E por não simplificar não sou cinderela, nem espero príncipe.

Por não simplificar arroto na mesa.
Xingo.
Grito.
Bebo.
E adoro escatologias.

Romantismo é exaustivo.E realismo, antiestético.
Mas nunca ninguém me ofereceu romantismo.
E nunca me senti solicitada a oferecer.
O realismo oportunista penetrou-me a alma.
E inevitavelmente acostumei-me a ele.

Não uso espartilho - e, às vezes, nem sutiã.
Porque sou mais que mulher moderna. Sou mulher errada.
Sou fruto Surrealista.
E com tristeza assumo não acreditar em 'felizes para sempre'.
Porque enfim, é uma escolha. Ou perco feminilidade ou perco feminismo.

Orgulho

Gosto de ser chata, taciturna, egoísta.
Mas, principalmente, gosto de ser ORGULHOSA.
Gosto de não gostar.
E excluir atitude do meu dicionário.
Esperar e somente esperar.
Esperar por alguém que ame e ame tanto que a mim caberá apenas continuar esperando.
Esperando ligações, perguntas e declarações.
Esperando que 'ele' seja incoveniente e surpreendente.
E que ligue nas madrugadas tirando o meu sono.
Porque é o que quero fazer.
E o que odeio querer fazer.
Porque o orgulho sempre impede.

'Ele' encarregarar-se do amor, da procura, da vontade, da chama.
E deixá-lo-ei queimar. E arderei pouquinho.
E se 'ele' existe ou não. Não faz a menor diferença para mim.
Pois ainda que existisse jamais 'o' amaria.
Pois 'ele' é alguém que eu criei para ME amar. Não para EU amar.
Alguém que que me impediria de sofrer para ser amada.
E que nunca me faria renunciar do orgulho.
Ele não é ninguém que potencialmente possa me conquistar, porque evito ser conquistada.
Ainda temo ser Amélia como todas que conheço.
Ou talvez, porque acredito que só sendo diferente - e indiferente - alguém goste mim.